A Unicamp está desenvolvendo, com tecnologia inédita no país, o Diagnóstico Automatizado de Parasitos Intestinais (DAPI). O exame de fezes passa a ser analisado por um computador, que identifica os parasitos e sugere resultados para o profissional que irá assinar o laudo. Na etapa laboratorial, o sistema DAPI tem demonstrado eficiência superior a 90% na avaliação de 15 espécies de parasitos mais prevalentes do trato digestório de humanos. A tecnologia foi desenvolvida por pesquisadores que trabalham no Laboratory of Image Data Science (LIDS) do Instituto de Computação (IC) da Unicamp, chefiados pelos professores Alexandre Falcão e Jancarlo Gomes, com o auxílio da empresa ImmunoCamp Ciência e Tecnologia e da Fapesp. Uma versão do sistema, desenvolvida pela Venort Indústria de Máquinas e Equipamentos, será lançada na Feira + Fórum Hospitalar da cidade de São Paulo, que acontecerá de 16 a 19 de Maio de 2017 no Expo Center Norte São Paulo. O protótipo será exposto no Estande Expositor da indústria BioBrasil Ciência e Tecnologia S/A, coirmã da ImmunoCamp.
Em rotina laboratorial, os exames parasitológicos das fezes dependem sempre da análise visual de lâminas de microscopia óptica e são muito comuns os erros humanos, sobretudo pelo cansaço dos profissionais dos laboratórios e pela falta de conhecimento de muitas espécies de parasitos intestinais. De acordo com estimativas, com 10 vezes de ampliação em lente objetiva de um microscópio, um profissional leva de dois a três minutos para conseguir analisar cerca de 50 campos de uma área de leitura de uma lamínula (22mm x 22mm) sobreposta em lâmina de microscopia. Já o sistema DAPI, é capaz de verificar cerca de 1.900 campos de imagens em um tempo de três minutos e meio para a mesma área de uma lamínula.
“A primeira grande vantagem de incluir a computação na análise de imagens é tentar superar a fadiga do ser humano. O computador é rápido e preciso em termos de reprodutibilidade. Sem aprendizado, ele sempre vai fazer a mesma análise e dar o mesmo resultado para a mesma imagem, mesmo que esteja errado”, observa o docente Alexandre Falcão. Ele afirma ainda que o ser humano é melhor em sua capacidade de abstrair o conhecimento. “A ideia nesta modalidade de diagnóstico é complementar o lado positivo da máquina com o melhor do ser humano. Porém, a máquina pode mostrar uma nova forma de resultado para o especialista, e ele, diante das informações e de sua experiência, pode concluir A ou B”.
De acordo com o professor Jancarlo, um laboratório multidisciplinar envolvendo as áreas da Ciência da Computação e da Saúde foi montado no LIDS. O processamento de fezes humanas é feito com controle de qualidade e biossegurança. Alunos de pós-graduação do IC e da área de Saúde da Faculdade de Ciências Médicas (FCM) trabalham no laboratório que tem a participação de cerca de 52 colaboradores nacionais e internacionais (http://lids.ic.unicamp.br/people).
O desenvolvimento e validação da técnica parasitológica de “TF-Test - Three Fecal Test”, em 2008, que oferece como vantagem a colheita tríplice de fezes em dias alternados e o processamento laboratorial com alta concentração parasitária livre, em grande parte, de impurezas fecais, possibilitou a viabilização e o desenvolvimento do sistema DAPI. Lâminas preparadas por outras técnicas parasitológicas inviabilizariam o diagnóstico no sistema DAPI, segundo o professor. “A partir da técnica de TF-Test é feito o processamento laboratorial da suspensão fecal a ser aplicada em forma de esfregaço na lâmina de microscopia”, comenta.
O sistema DAPI é capaz de fazer a varredura automatizada da lâmina e detectar os parasitos mostrados na tela do computador. “Técnicas computacionais separaram o fundo de imagens de componentes, dentre parasitos e impurezas, para verificar e decidir se é uma impureza ou uma entre 15 espécies parasitárias. Quanto maior o número de exemplos de parasitos na base de dados, o algoritmo vai ficando cada vez mais inteligente” destaca Falcão. “No entanto, a correta resposta das técnicas computacionais depende da boa qualidade de imagens de lâminas de microscopia, o que é característico na técnica parasitológica de TF-Test”, comenta o professor Jancarlo.
Os pesquisadores trabalham agora no aprimoramento do sistema de diagnóstico automatizado, com o início da etapa de validação laboratorial. O próximo passo será a validação de campo, que deverá ser feita em dois renomados laboratórios de análises clínicas do Brasil. “Considerando que as rotinas laboratoriais, público e privada, do país correspondem a mais de 30 milhões de exames de fezes por ano, é grande o potencial para as aplicações desta tecnologia no mercado”, afirma Jancarlo Gomes.
Em um futuro próximo, os estudos epidemiológicos também seriam favorecidos. “Com acesso as imagens obtidas por este equipamento distribuído no Brasil, em diferentes laboratórios, teríamos condições de entregar temporariamente para o poder público relatórios fidedignos de prevalências parasitárias por regiões”, salientou.
Os professores também ressaltam que além de possibilitar a formação de alunos e em diversas publicações científicas nacionais e internacionais, o desenvolvimento do sistema já propiciou três resultados de patentes e, em breve, deverá oferecer novas fontes de recursos à Universidade com o recebimento de royalties por um período de até 20 anos.
Projeto Fapesp
O sistema DAPI teve início com um Projeto Auxílio da Fapesp, sob a coordenação de Alexandre Falcão. Em seguida, foi estendido por meio de outro projeto da agência de fomento paulista, coordenado por Jancarlo Gomes. O DAPI faz parte de uma das principais aplicações de um Projeto Temático Fapesp, coordenado por Falcão.
Outros projetos do LIDS dão continuidade à linha de pesquisa que investiga a interação homem e máquina na tomada de decisões. No laboratório são estudados o processamento, a análise e a visualização de dados de imagens tridimensionais de todas as áreas das Ciências e da Engenharia. Nos diagnósticos biomédicos, por exemplo, a máquina pode deixar claras as vantagens e limitações de determinadas ações.