Na decisão, o ministro ressaltou que o sigilo da fonte é uma prerrogativa concedida a qualquer jornalista como garantia da ordem jurídica, além de viabilizar, em favor da própria sociedade, a ampla pesquisa e divulgação de fatos ou eventos em prol do interesse público.
Conforme os autos, a matéria jornalística abordou irregularidades ocorridas em condomínio residencial localizado na cidade de Ribeirão Preto (SP), entre elas a atuação de A.F.C. como segurança particular da síndica, o que gerou sanção disciplinar, uma vez que, na qualidade de policial, ele portava arma de fogo fora do expediente de trabalho. Após várias denúncias dos moradores alegando que o policial teria praticado supostamente os crimes de ameaça, injúria e abuso de poder, a equipe de reportagem do autor da reclamação decidiu investigar os fatos, o que gerou a matéria. Perante a Justiça, a Empresa Paulista de Televisão S/A – proprietária do site – argumentou que os fatos são públicos e notórios, além de terem motivado o ajuizamento de demandas judiciais nas esferas criminal e civil.
Na reclamação, a empresa sustentou que a decisão questionada, bem como o acórdão que a confirmou – proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo –, teriam desrespeitado a autoridade da decisão do Supremo no julgamento da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 130, que declarou a não recepção da Lei de Imprensa (Lei 5.250/1967) pela Constituição de 1988.
Ao analisar o caso, o ministro Celso de Mello enfatizou que, mais do que simples prerrogativa de caráter individual ou de natureza corporativa, a liberdade de informação jornalística desempenha “relevantíssima função político-social, eis que, em seu processo de evolução histórica, afirmou-se como instrumento realizador do direito da própria coletividade à obtenção da informação”. Segundo ele, em diversas decisões que proferiu na Corte, “o exercício da jurisdição cautelar por magistrados e tribunais não pode converter-se em prática judicial inibitória, muito menos censória, da liberdade constitucional de expressão e de comunicação, sob pena de o poder geral de cautela atribuído ao Judiciário qualificar-se, perigosamente, como o novo nome de uma inaceitável censura estatal em nosso País”.
Em sua decisão, o ministro observou, ainda, que a repulsa à censura foi consagrada em nosso constitucionalismo democrático e representa compromisso assumido internacionalmente pelo Brasil. “O fato é que não podemos – nem devemos – retroceder neste processo de conquista e de reafirmação das liberdades democráticas. Não se trata de preocupação retórica, pois o peso da censura – ninguém o ignora – é algo insuportável e absolutamente intolerável”, afirmou o relator.
Ele ressaltou que a liberdade de imprensa assegura aos profissionais de comunicação social o direito de buscar, de receber e de transmitir informações e ideias por quaisquer meios, inclusive digitais, ressalvada a possibilidade de intervenção judicial após eventual prática abusiva dessa prerrogativa, “resguardado, sempre, o sigilo da fonte quando, a critério do próprio jornalista, este assim o julgar necessário ao seu exercício profissional”. Nesse sentido, o ministro citou o Inquérito 870, do qual foi relator.
Dessa forma, o ministro Celso de Mello destacou que a liberdade de imprensa, na medida em que não sofre interferências governamentais ou restrições de caráter censório, “constitui expressão positiva do elevado coeficiente democrático que deve qualificar as formações sociais genuinamente livres”. Também avaliou que a prerrogativa do sigilo da fonte qualifica-se como instrumento de concretização da própria liberdade de informação, “atuando como verdadeira garantia institucional asseguradora do exercício do direito fundamental de livremente buscar e transmitir informações”.
Ao final de sua decisão, o relator ressaltou que o sigilo da fonte é prerrogativa que não pode ser qualificada como mero privilégio de ordem pessoal ou de caráter estamental, mas é meio essencial de plena realização do direito constitucional de informar, “revelando-se oponível, por isso mesmo, em razão de sua extração eminentemente constitucional, a qualquer pessoa e, também, a quaisquer órgãos, agentes ou autoridades do Poder Público, inclusive do Poder Judiciário, não importando a esfera em que se situe a atuação institucional dos agentes estatais interessados”.
O ministro Celso de Mello salientou, ainda, que o jornalista não pode sofrer sanção de qualquer natureza, direta ou indireta, em razão do exercício de sua prerrogativa constitucional de preservar o sigilo da fonte, sob pena de ilegítima interferência estatal na busca e transmissão de informações.
Por essas razões, julgou procedente a reclamação, para invalidar a decisão do juízo de Direito da 2ª Vara Cível da comarca de Ribeirão Preto (SP) e o acórdão do TJ-SP que a confirmou. O ministro também julgou prejudicado agravo regimental contra liminar que ele deferiu anteriormente, que suspendeu os efeitos das decisões atacadas.