O procurador da República Carlos Fernando dos Santos Lima, integrante da força-tarefa da Lava Jato, afirmou nesta segunda-feira (14) que foi convidado no ano passado para uma reunião à noite, no Palácio do Jaburu, com o então vice-presidente Michel Temer (PMDB) e que recusou o convite. A reunião aconteceria no dia da votação do impeachment de Dilma Rousseff (PT),em 2016.
A informação foi dada por Lima ao comentar o encontro noturno da futura procuradora-geral da República, Raquel Dodge, com Temer (PMDB) na semana passada. O caso teve repercussão por se tratar de mais um encontro fora da agenda oficial do presidente.
"Tenho para mim que encontros fora da agenda não são ideais para nenhuma situação de um funcionário público. Nós mesmos, no dia da votação do impeachment, fomos convidados a comparecer ao Palácio do Jaburu à noite e nos recusamos, porque entendíamos que não tínhamos nada o que falar com o eventual [novo] presidente do Brasil naquele momento", contou durante evento organizado pela Amcham (Câmara Americana de Comércio) em São Paulo.
A reportagem do UOL questionou a Presidência da República sobre a declaração do procurador, mas, ainda não obteve resposta.
Lima esclareceu que a equipe recebeu o convite através de um interlocutor do então vice-presidente Temer e que, apesar de não ter ocorrido o encontro, houve uma reunião com o então assessor da vice-presidência, o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), acusado de corrupção no caso JBS.
"Ele [Loures] nos convidou a ir até o Palácio [do Jaburu], e nós dissemos que não. O máximo que foi feito foi uma conversa sobre a manutenção da equipe da Polícia Federal, que infelizmente agora está desfeita", disse Lima.
A conversa foi entre Loures e os procuradores Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato, e Roberson Pozzobon.
Ao ser questionado sobre o que achava do encontro entre Temer e Dodge, o procurador afirmou não ser "corregedor" do Ministério Público. "Nós tivemos situação semelhante e nos recusamos a comparecer. Temos agora que avaliar as consequências que dentro da política que o Ministério Público vai ter a partir da gestão Dodge", acrescentou.
Dodge afirmou cinco dias depois do encontro, através de nota, que a audiência constava na sua agenda pública e que teve por objetivo discutir a posse do cargo, que está prevista para o dia 18 de setembro.
Lima disse ainda que "todo funcionário público é responsável pelos atos que tem" e que, "infelizmente, não há como fugir da responsabilização das pessoas perante a sociedade".
Ao ser questionado sobre se as diferenças de posição Dodge e o atual procurador-geral da República, Rodrigo Janot, podem influenciar no andamento das forças-tarefa da Operação Lava Jato, Lima afirmou que cada grupo tem "a inteira responsabilidade pelos atos que tomam" e que também houve muitos conflitos com Janot.
"O procurador-geral pouco pode influenciar nas decisões, nós mesmos tivemos muitos conflitos com o Rodrigo Janot nesse período, uma parte resolvida internamente sem nenhum tipo de problema", disse.
Segundo ele, no entanto, não deve haver nenhuma mudança por parte de Dodge de postura ante o combate à corrupção. "Dodge tem histórico muito bom e muito forte na área criminal, inclusive no Ministério Público Federal, e a equipe dela é excelente, que atuou inclusive no caso do mensalão. Então não acreditamos que a mudança na essência. O Ministério Público só tem uma atividade: investigar e acusar quem for o responsável pelo crime", disse.
Lima afirmou ainda que "internamente" procuradores e agentes da Polícia Federal têm procurado trabalhar da mesma maneira, apesar das mudanças ocorridas no organograma das equipes da PF responsáveis pelas investigações da Lava Jato. Mas, segundo ele, "questões institucionais enfraquecem relacionamentos", se referindo a desentendimentos sobre acordos de delação premiada.
"Nós inclusive defendemos a equipe [da PF] de Curitiba em relação a retaliações que poderiam vir do Ministério da Justiça inclusive agora denunciando esse enfraquecimento das investigações em Curitiba. Entretanto, há limites e esse limite é a Constituição. Existem determinados fatos que não são negociáveis, como é o caso das colaborações. Nós entendemos que somente o Ministério Público pode negociar acordos porque só o Ministério Público pode acusar, quanto mais abrir mão de uma acusação", comentou.
Ele disse ainda, no entanto, que o MPF sempre procurou trazer a PF para as negociações dos acordos de delação premiada.